Fazer cinema no Ceará Imprimir
Escrito por Administrator   
Sex, 10 de Junho de 2011 20:40

O cinema cegou ao Ceará. Não falo da mera distribuição de filmes para as salas de cinemas locais; me refiro a produção. O Ceará,  mais especificamente em sua capital, Fortaleza, vive um momento único na sua história quando o assunto é cinema. Nunca se produziu tanto, nunca se esteve tão em voga.

 

O momento é bastante positivo quando pensamos no cinema aqui no Ceará há 10 anos atrás. Com a chegada do digital ficou mais fácil produzir, junte a isso, o curso de graduação em Cinema e Audiovisual da UFC, o curso de Realização em Audiovisual da Vila das Artes, o crescimento das políticas públicas de incentivo  ao audiovisual e temos um cenário bastante oportuno para quem deseja adentrar no mundo do cinema sem precisar sair daqui.

O estudante de graduação em Cinema e Audiovisual da UFC, Victor Costa, é um exemplo de como o cinema e o interesse em fazer cinema aqui vem crescendo em várias vertentes. “Quando prestei vestibular em 2009, tive dúvidas se ficaria no Ceará ou tentaria cursar cinema no Rio de Janeiro. Preferi ficar, porque na época tinha a opinião de que aqui faltavam pessoas que pudessem produzir, e eu poderia ser uma delas”.

Passados pouco mais de 1 ano de curso, Victor já percebe uma produção forte e constante, e apesar das dificuldades ainda evidentes no processo de produção de filmes, a falta de equipamentos, estúdios, produtoras, distribuidoras, laboratórios, técnicos e verba para produção, ele enaltece a vontade de fazer filmes, que se coloca acima de qualquer empecilho técnico.


Podemos considerar a existência de um "cinema cearense"?

“Não sei”. A resposta de Marcelo Ikeda,  critico, realizador, professor mestre e pesquisador do Instituto de Comunicação e Arte da UFC, que veio do Rio de Janeiro para lecionar no curso de Cinema e Audiovisual da UFC em 2010, é sincera e coloca em evidência uma questão complicada e por vezes polêmica.

Para ele essa denominação deve ser vista mais como um objeto de provocação do que como uma definição conceitual. “O que é que nós podemos chamar de “cinema cearense”? É um cinema feito no Ceará? É um cinema com temáticas cearenses? A geografia é cearense? Se passa no Ceará? O diretor é cearense? A equipe de produção é cearense? A empresa produtora é cearense? O que é?”, questiona.

Compartilhando de opinião semelhante, o estudante do curso de cinema da UFC, Victor Costa, não se satisfaz com essa nominação e percebe muitas lacunas e incoerências deixadas por esse tipo de generalização. Ele diz que devemos tomar cuidado com esses “batismos”, que podem soar egoístas e precipitados. Segundo ele, a impressão produzida por esses “rótulos” estabelece uma relação que muitas vezes não é adotada pelo filme em si, que não está interessado em participar desse tipo de discussão.

 

“Os dois lados da moeda"

Para o professor e pesquisador Marcelo Ikeda, as características de produção do cinema produzido no Ceará podem ser dividas em dois lados distintos, mas que não se excluem. O primeiro é o crescimento e o fortalecimento de um cinema de grandes produtores, abrangendo uma perspectiva comercial.

Podemos perceber o interesse de empresários e produtores daqui do Ceará no investimento em obras audiovisuais de grande apelo comercial, com capacidade de concorrer com qualquer outra produção nacional de mesmo porte. Ikeda ainda ressalta “É interessante ver como um estado periférico como o ceará, consegue fazer um filme em condições competitivas de ser lançado no mercado como um todo”.

Um exemplo citado por Ikeda, é o filme “As Mães de Chico Xavier” que segue a tendência de filmes espíritas lançados nos últimos anos e tem uma produção quase que inteiramente cearense. Produzido pela produtora cearense Estação da Luz, “As Mães de Chico Xavier” foi distribuído pela Paris Filmes e estreou no dia 1° de abril de 2011 em aproximadamente 400 salas de cinema em todo o Brasil, sendo visto por mais de 500.000 mil espectadores. Estando entre os 10 maiores lançamentos da retomada até hoje.

O segundo ponto a ser observado nessa produção cinematográfica contemporânea  no Ceará são os filmes feitos por coletivos de amigos que seguem um modelo de produção próprio, de baixo custo, e sem a preocupação com o mercado; ao contrário, são filmes que buscam exatamente a quebra com esse cinema comercial.

“É um cinema de renovação de linguagem, de extremo baixo custo que se utiliza das tecnologias digitais e atua com um modo de produção mais flexível e não hierarquizado”, ressalta Ikeda.

Um bom exemplo é o filme “Estrada para Ythaca”, realizado pelos Irmãos Luis e Ricardo Pretti, Guto Parente e Pedro Diógenes, os dois últimos oriundos da primeira turma do curso de Realização em Audiovisual da Vila das Artes. O filme ganhou repercussão nacional e internacional após ganhar o prêmio de Melhor Filme durante a Mostra de Tiradentes no estado de Minas Gerais em 2010. “É um filme muito curioso porque ele quebra com essa hierarquização do modo de produção industrial, onde temos 4 diretores exercendo todas as funções do filme, sendo inclusive os próprios atores”, aponta Ikeda.

No entanto, apesar do aparente conflito de idéias e interesses dessas duas tendências em relação a forma de se fazer cinema, o professor Ikeda acredita em um diálogo possível entre essas duas correntes, não sendo estas pontos excludentes e concorrentes. De acordo com Ikeda, há uma margem muito grande para um processo de intercessão e mais ainda, uma mistura de processos produtivos.



Artur Mota
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Última atualização em Dom, 12 de Junho de 2011 18:00